21.1.10

A menina e o lobo

A Lili estava com medo de entrar na floresta, e nada que a mãe falasse a faria ir. - Não, mamãe, tem um lobo lá! Nisso, chega um menino pouco maior que Lili e clama: - Não se preocupa, o lobo tava lá, mas eu dei um pau nele e ele fugiu!

E vai Lili, feliz da vida, entrar no bosque.

10.1.10

Desconstrução

O peixe - não aquele, outro - cansou do perfunctório e decidiu se aventurar. Nadou contra a corrente com força e determinação. Por revés, destino, ou determinação do Escritor, entrou pelo esgoto. Mas não havia motivo que o fizesse desistir - afinal, era esse mesmo seu objetivo: conhecer. E foi se apertando cada vez mais na água imunda do encanamento de uma casa. Até que entalou, e permaneceu entalado até que morresse. Seu cadáver era tão humano que o dono da casa culpou a Deus quando foi se aliviar e teve seu sábado inundado.

7.1.10

A boca e a testa

As lembranças mais insignificantes vêm em palavras. Os pensamentos mais medíocres vêm em palavras. Tudo que importa é feito em fotografias. Aliás, o que é uma palavra se não um milésimo de uma imagem? E sempre que alguém abre a boca pra vomitar as ditacujas, não ouço, não reflito. Porque da boca pra fora e da testa pra dentro, não há coisa igual.

4.1.10

Crime perfeito

O peixe queria voar. A borboleta queria nadar. Decidiram trocar de corpos. O peixe, vestido das asas e cores da borboleta, voou e voou, sentindo a liberdade do azul do céu formar um degradê com a paixão e o desejo de ir cada vez mais ao infinito. A borboleta, no corpo do peixe, saltou da água e comeu seu corpo antigo, sem titubear. E decidiu virar peixe-voador.

2.1.10

Do mau e do entendido.

'Era forte, nem tanto. Era um tanto bonito, dos cabelos às pernas. Tinha um coração grande; nunca tinha machucado ninguém, não por vontade. Se uma palavra o definisse, seria 'altruísmo'. Talvez 'sacrifício', se não as considerasse sinônimas.
Viu um homem em cima de uma mulher, a mulher parecia gritar. Estava machucada, com certeza. Não olhou duas vezes: tirou o homem de cima dela à força e a carregou a um lugar seguro. Voltou-se ao homem e deu-lhe uma surra. Não contente, entregou-o às autoridades e fez com que fosse condenado por crime sexual.
30 anos depois, recebeu flores e nelas um cartão: "Eu era inocente".

...as flores eram do homem, que era, mesmo, inocente.'

Mas o curioso escritor, mais uma vez, deixou a história à gaveta. Não tinha lá um desfecho interessante.